domingo, 10 de abril de 2011

O poder da mídia

"Os homens brigam com mais frequência por via das palavras. É por palavras que eles matam e se fazem matar com maior empenho."


Após o nascimento da imprensa, diminuiu o uso da força para o exercício e a conquista do poder. A imprensa passou a ser um instrumento nas mãos do poder e ganhou muito com isso, tanto que hoje, nas democracias liberais, ostenta o título de quarto poder – autônomo, logo após do Executivo, Judiciário e do Legislativo, exercido em favor do povo, que através dos anos elegeu a imprensa como seus olhos para fiscalizar aqueles que comandam a sociedade.
Por se definir como poder paralelo, a imprensa acabou se tornando um elemento perigoso na construção de imaginários sociais e na construção daquilo que se compreende como realidade.
A imprensa é essencial em qualquer projeto de formação de ideologias. Desde que Johann Gutemberg, em 1440, inventou a tipografia e permitiu a impressão em massa, a impressa vem sendo utilizada pelo poder. A invenção da imprensa, de fato, coincide com a criação das nações e do Estado moderno e com o exercício do poder não apenas de forma coercitiva, pelo uso da força, mas por meio de formas mais sutis de
coerção e de persuasão. A história da imprensa é a própria história do desenvolvimento da sociedade capitalista. E a grande mídia acaba se tornando um instrumento dos grandes interesses capitalistas (indústria dos remédios, dos combustíveis e, quem sabe, talvez a mais terrível de todas, das armas). A manipulação da mídia como instrumentos de defesa de interesses comerciais, no Brasil, ficou uma vez mais explícita durante o processo de discussão do referendo do desarmamento, quando a revista fez uma campanha contra (7 razões para votar não). O resultado todo mundo sabe. Venceu a truculência, a violência... a ignorância. Agora, a revista Veja se esquece de que ela ajudou a colocar armas nas ruas e estampa em sua capa um manifesto de repúdio à violência, apenas para vender revistas explorando o emocional do país, ainda abalado pelo drama que todos vivem.

PARA REFLETIR

“....O rapaz que entrou na escola atirando não se encaixa em nenhum perfil que permita esbravejar. Até onde se sabe, não era traficante, ladrão, fugitivo. Não era militante de nenhum partido, não lutava jiu-jítsu, não era um skinhead, não pertencia a nenhuma torcida organizada. Até onde se sabe, não usava drogas, não bebia, não era pedófilo, não era evangélico, não era muçulmano, não era judeu, não era cristão, não era xiita, não era sunita, não tirava racha na rua, não tinha suásticas tatuadas na pele, não pertencia a nenhuma seita, não era gótico, não era punk, não ouvia Bossa Nova, não usava piercing, não era rico, não era pobre, não era gordo, não era magro, não estava em liberdade condicional, não tinha passagem pela polícia, não vivia no Complexo do Alemão, não era do Jardim Ângela, não morava numa cobertura da Vieira Souto, não era nada. Segundo sua irmã, ele era estranho.
Estranho.
Seu nome era Wellington de Oliveira, um nome bem brasileiro, há milhares de Wellingtons, Washingtons, Andersons. O Brasil tem um estranho fascínio por W e por nomes que terminam em "on".
Wanderson, Jackson, Jobson, Richarlyson. Ele era um Wellington de Oliveira.Quando não se pode culpar traficantes, fugitivos, ladrões, militantes, lutadores, skinheads, nazistas, torcedores organizados, drogados, cristãos, bêbados, pedófilos, muçulmanos, góticos, magros, evangélicos, rachadores, punks, gordos, xiitas, ricos, pobres, nem o prefeito, nem o governador, nem a presidenta, nem o ministro, nem o secretário, nem a polícia, nem o senador, nem o deputado, nem a diretora da escola, nem o médico, nem o professor, culpamos quem?
Culpamos quem?
Quando não podemos culpar ninguém, chegou a hora de assumir o que somos. Uma espécie fracassada, violenta, agressiva, condenada à extinção. Uma espécie habituada à barbárie, e que não se imagine que "nos transformamos em". Sempre fomos assim, indecentes, obscenos, há séculos nos matando em guerras, inquisições, pogroms, chacinas, massacres, genocídios, atropelamentos, assassinatos, latrocínios, torturas, execuções. E pragas, pestes, terremotos, incêndios, tsunamis, deslizamentos, enchentes. Um moto-contínuo de mortes, mortes, mortes, e vinganças, vinganças, vinganças, ódio.
A criança é o pai do homem. Guardo um pequeno cartão com essa frase no meu carro, há anos está lá, era o convite da formatura do meu mais velho no pré-primário. Não o guardo como mantra ou guia espiritual. Está lá porque está lá, porque o carro que nos levou à formatura do pré ainda está comigo, e lá ficaram o cartão e a frase. De vez em quando uso o cartão, de papel de alta gramatura, cartolina, talvez, porque quando o vidro sobe levanta uma rebarba da forração da porta, e o cartão serve para colocar a forração no lugar. É um uso banal, irrelevante, coloco o cartão entre o vidro e a forração da porta, e tudo fica no lugar, tudo volta ao seu lugar. Um uso banal e irrelevante, mas que me faz ler essa frase todos os dias, ou, pelo menos, quando preciso colocar a forração da porta no lugar.

A criança é o pai do homem.

Wellington ajudou a nos matar mais um pouco hoje. É um erro, Wellington, matar-nos aos poucos. Da próxima vez, Wellington, mate-nos a nós, direto, sem intermediários.
Mate o homem, Wellington, não seus pais.”
Colaboção: Flávio Gomes

2 comentários:

  1. Alessandra Justino (psicóloga)11 de abril de 2011 às 10:00

    Parabéns pela linda postagem sobre a revista Veja. Realmente a grande mídia manipula os fatos em nosso país, nos levando a formar conceitos errados e, muitas das vezes imorais. Um deles foi o referendo do desarmamento, graças à Revista Veja, Sistema Globo etc, povo acabou votando pelo não.

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  2. O referendo era sobre poder ou não comprar uma arma de forma legal para tê-la em casa -- a lei não permite "pessoas comuns" portar armas. Ora, por que dizer que essa tragédia foi causada pela falta da lei que proibiria ter uma arma legal em casa sendo que há uma outra lei que proíbe andar armado? Mais uma idiotice dos autores do blog.

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