sexta-feira, 8 de abril de 2011

A MATANÇA NA ESCOLA


“Um grito ouviu-se em Ramá, de pranto sentido e lamentação: é Raquel que chora seus filhos, e não quer ser consolada, porque eles não existem mais”  (Mt, 2, 18)

A dor indizível e inconsolável das famílias que perderam suas crianças, até há pouco alegres alunos da Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio, exige de nós consternada solidariedade.  Ter filhos, netos, irmãos, primos ceifados no alvorecer da vida é a pior tragédia que pode acontecer, e só o conforto humano e alguma fé dará forças para seguir sobrevivendo. Perdê-los no espaço sagrado de uma sala de aula, no início da manhã ensolarada, é mais absurdo ainda.
Mas o acontecimento terrível também impõe profunda reflexão.  Uma tragédia como esta não se insere no painel tristemente costumeiro da criminalidade, mas no da violência social insana. É difícil reconhecer que os gatilhos exterminadores também foram, de maneira indireta e invisível, apertados por todos os que temos responsabilidade pública. Mas a matança perpetrada por um indivíduo mentalmente degradado tem propulsores sociais que nos dizem respeito. 
O assassino estava com duas pistolas e fartamente municiado porque é frouxo o controle da circulação de armas e munições em nosso país. O armamentismo ilegal é objeto de crescente tráfico, e favorecido também pela cultura importada do ‘cada indivíduo uma arma’;
O criminoso imbuiu-se de uma ‘missão de terror’ porque os meios de comunicação de massa e de ‘entretenimento’ disseminam serial killers, vídeo-games, filmes e seriados propagadores da violência, da eliminação dos adversários como valor maior, do espetáculo da destruição;
O demente, no seu isolamento, em sociedade sem política pública preventiva de saúde mental, cristalizou comportamento mórbido talvez também estimulado por fundamentalismos e fanatismos contemporaneamente exacerbados;
O matador encontrou facilidades no seu trajeto de morte porque nossas precarizadas escolas públicas já não têm quantitativo de servidores, dentro delas e no seu entorno, que possa contribuir para maior segurança do cotidiano pedagógico.
O homicida, já condenado definitivamente, foi produzido, de alguma maneira, também por nossa omissão, por nossa indiferença, por nossa demissão cidadã. Talvez por nossa adesão ao mundo torpe da competição desvairada, da eliminação do outro, do desprezo pela dignidade da vida humana.  Ambiente civilizatório perverso que muito(a)s educadore(a)s – tantas vezes vítimas dele -  lutam por transformar, para que nossas crianças tenham possibilidade de futuro.


COLABORAÇÃO:
Chico Alencar é professor, tendo lecionado por 20 anos na rede municipal do Rio de Janeiro, e exerce mandato de deputado federal (PSOL/RJ)

Um comentário:

  1. Amigos!
    Neste momento de imensa dor que nos assola, fica uma mensagem de esperança!

    "Existirá
    Em todo porto tremulará
    A velha bandeira da vida
    Acenderá
    Todo farol iluminará
    Uma ponta de esperança

    E se virá
    Será quando menos se esperar
    Da onde ninguém imagina
    Demolirá
    Toda certeza vã
    Não sobrará
    Pedra sobre pedra

    Enquanto isso
    Não nos custa insistir
    Na questão do desejo
    Não deixar se extinguir
    Desafiando de vez a noção
    Na qual se crê
    Que o inferno é aqui

    Existirá
    E toda raça então experimentará
    Para todo mal
    A cura"

    ("A Cura", Lulu Santos / Nelson Motta)

    Abs a todos e Bom fds

    ResponderExcluir